domingo, 13 de dezembro de 2015

Reinversão

"Outro dia eu pensei que estava com os olhos abertos, mas daí eu abri eles e então percebi que estavam fechados", falou e rompeu na gargalhada mesmo tendo a boca cheia de comida e a comida caía pra fora em cima da mesa. "Ótimo..." pensei.
A sala estava completamente vazia, mas isso não resolvia nada. As paredes ainda estavam lá marcando os limites. Pela janela dava ainda pra ver os móveis jogados no meio da rua atrapalhando a passagem das pessoas. "Tanto faz, elas não sabem mesmo pra onde vão". De todo modo, esse transtorno não era suficiente para que essas pessoas de fora fossem completamente impedidas de seguir seus caminhos. Elas acabavam passando, desviavam da escrivaninha atravessada no chão, escorregavam por cima dos livros amontoados na calçada, colocavam de lado algumas cadeiras e camas e seguiam adiante.
Resolvi recolher as coisas, colocá-las de volta pra dentro. Quando percebi estava deitado no chão, descansando. Fingia que estava acordado quando ouvia algum barulho. Essa atitude durou por todo o tempo. "O tempo, então, perdeu-se" pensei.
Quando me levantei do chão notei, no entanto, que estava enganado.
Algumas pessoas que passavam ajudaram a atear o fogo sobre as coisas que permaneciam espalhadas pela rua.
Aquelas coisas, depois de algumas horas, foram completamente reduzidas a cinzas e puderam assim ser facilmente varridas para dentro. "Inevitavelmente, de qualquer outro modo, os móveis teriam continuado a ser peças separadas. Apenas agora, que já são cinzas, eles existem como unidade. As coisas se tornaram pacificamente indistinguíveis umas das outras. Ótimo! Mas, nessas condições, isso já não presta mais pra nada. São apenas cinzas, não é mesmo?" Essas conclusões breves eu disse ao dono do bar da esquina, cuja postura era de uma indiferença indisfarçável.
Tudo isso teria, no dia seguinte, desdobramentos, consequências, prosseguimento, negação. Mas já era fim da tarde e o sol que logo em seguida se pôs, inesperadamente, não voltou a nascer. De qualquer forma, ninguém poderia adivinhar que justamente agora seria assim.

Um comentário: